Sunday, February 17, 2008

Velinhas de Desejos e Segredos de Chocolate

Certo dia, uma menina sonhou. Afundada entre pensamentos e penas de ganso, ela repousava profundamente em sua inocência e imaginara-se crescida, altiva e de grande sucesso.
Vira-se casada, com dois filhos de comercial de televisão, um marido atencioso e carreira promissora. Ela era jornalista das mais conceituadas, o mundo a reverenciava por sua ética e boa escrita. Sempre convidada para os melhores eventos do ano, portava-se impecável. Seus filhos eram exemplos na escola dos sonhos e todas as suas amigas a rondavam por admiração.
Até o dia que ela não fora trabalhar.
Deste sonho, em que tudo dera certo, ela se cansou.

Decidiu investir em outro ramo de suas aspirações, descartou o marido e, neste sonho, resolveu não ter filhos, ela queria continuar jovem. Tornara-se agora artista, das mais famosas e belas.
Ela tinha todos os homens aos seus pés e as mulheres a invejavam como nenhuma outra. “A fama subiu a cabeça”, diziam. Mas ela não acreditava, sentia-se cada vez mais poderosa, invencível quase e teve a certeza de que o mundo não sobreviveria sem tê-la a idolatrar.
Vestia casacos de pele, sapatos e bolsas de couro legítimo e logo, todos os seus princípios escorreram pelo esgoto de suas idéias.
Mais um dia e ela sofrera um acidente, perdendo a beleza na qual sua vida se apoiava.
Desistiu deste também.

Em sua próxima tentativa, quis ser resultado de profundos esforços de toda uma vida e tornara-se uma intelectual.
De primavera a primavera ela atuava para o bem de seu próximo, estudava os céus e a terra, órgãos e microorganismos. Ganhou prêmios, ajudava aos pobres e deficientes, consideravam-na um verdadeiro tesouro da humanidade.
Os que dela se aproximavam eram considerados leigos e, na perspectiva de finalizar sua ignorância, ela sentia-se como se desse uma eterna aula sobre o estabelecimento de conversas produtivas, encontrando um bem maior nas relações humanas.
Logo, adentrara sem retorno na solidão dos que sabem demais.

Na eterna busca pela medida certa de esplendor, o sonho enegreceu. Suas maiores aspirações deram lugar aos mais desesperados temores e ela agora se via no jardim de encruzilhadas. A luz tênue fornecia apenas a certeza de que estava sozinha e, assim estando, custava a ela (e a ela somente) o fardo de trilhar sua própria vida.
Vacilou, a princípio. Chegou a pensar onde estava o ombro amigo que precisava. Descobriu que se não lhe dera a devida importância em seu devaneio de vitórias, com certeza este não vagava por estas terras de solidão. Pensou em desistir.
No entanto, suas pernas trêmulas aceitaram o desafio que a mente não ousava considerar. Ela foi em frente.

Acordou na manha de seu aniversario ainda atordoada pelo insucesso de seus questionamentos e ambições. Sorrindo amarelo e com olhos vagos, recebia os convidados e seus formais desejos de 'felicidades' e 'tudo de bom', perguntando-se o que realmente eles lhe desejavam.
Que tipo de felicidades correspondem estas afirmações? Paz, amor e saúde são os conceitos clássicos, mas a que custo e intensidade obtê-los? Será que eles compreendiam o sentido de felicidade para ela e, desta maneira, o que verdadeiramente a faria feliz? Ou diziam aquilo apenas porque era de praxe, uma frase automática sem resquícios de interesse real, como os que complementam um “Oi” com “tudo bem?” desprovidos de qualquer curiosidade se a pessoa realmente vai bem ou mal.

“Feliz aniversário, felicidades!”, lhe disseram, seja lá o que isso quer dizer.
Entoaram os parabéns em volume e animação dignos de um ente amado. Percebeu, então, que dera valor demasiado aos padrões de felicidade sugeridos tanto por seus mais próximos amigos quanto ao ideal imposto pela sociedade.
Seguir o caminho indicado por placas de transito a faria viver num mundo de cores desbotadas. Melhor seria enfrentar o túnel de suas limitações rumo ao minusculo ponto de luz à frente.

Assim, ao apagar as velinhas ela se sentiu um tanto boba ao pedir sua única certeza: “Quero encontrar o meu modo de ser feliz.”

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